Métodos Alternativos
Histórico e Contexto
O uso de animais nas ciências da vida remonta à Grécia antiga e aos primeiros experimentos médicos. Durante séculos, médicos e pesquisadores utilizaram animais para conhecer melhor o funcionamento de órgãos e sistemas do corpo humano e aprimorar suas habilidades cirúrgicas. A ascensão da ciência biomédica moderna no século XIX causou o aumento do número de animais utilizados em experiências, bem como da resistência à vivissecção. Embora a opinião sobre o grau de sofrimento experimentado por animais variasse entre os cientistas e o público, a maioria dos cientistas ficou unida na crença de que experiências em animais eram fundamentais para expansão do conhecimento.
Após o nascimento da indústria química sintética no final de 1800, o campo da toxicologia cresceu em resposta à necessidade de se compreender como dezenas de milhares de novas substâncias poderiam afetar a saúde dos trabalhadores e consumidores envolvidos na sua produção e utilização. O uso de animais vivos para estudar os efeitos adversos potenciais de novos medicamentos, aditivos alimentares, pesticidas e outras substâncias passou a ter maior consistência durante a década de 1920, quando o farmacologista J.W. Trevan propôs a “dose letal para 50 por cento” (DL50) para a determinação da dose única de uma substância química que mataria metade dos animais expostos a ele. A idéia de um índice de toxicidade comparativa oferecia apelo imediato às agências reguladoras dos governos – tanto que as variantes do ensaio DL50 continuam sendo os testes em animais mais prevalentes até hoje.
A publicação do livro “Principles of Human Experimental Technique” pelos pesquisadores William Russel e Rex Burch em 1959 iniciou o movimento de proteção aos animais usados em experimentação, e representou um marco na discussão sobre a utilização de animais para a avaliação de toxicidade. A partir deste, fica estabelecido o princípio dos 3R´s que, nas décadas seguintes à sua publicação, possibilitou a união dos pesquisadores e defensores do bem-estar animal em torno de um objetivo comum: encontrar alternativas cientificamente válidas para os testes feitos em animais.
No avanço da ciência nos anos posteriores, ficam mais claras as diferenças metabólicas e de respostas que controlam a homeostasia tecidual em animais e humanos e fica evidente a necessidade de modelos in vitro mais apropriados.
Princípio dos 3R’s:
Reduction ou Redução
reflete a obtenção de nível equiparável de informação com o uso de menos animais;
Refinement ou Refinamento
promove o alívio ou a minimização da dor, sofrimento ou estresse do animal;
Replacement ou Substituição
estabelece que um determinado objetivo seja alcançado sem o uso de animais vertebrados vivos.
Definição de métodos alternativos
De fato, métodos alternativos podem ser definidos como qualquer método que possa ser usado para substituir, reduzir ou refinar o uso de experimentos com animais na pesquisa biomédica, ensaios ou ensino.
“uma experiência não poderá ser executada em animal se um outro método cientificamente satisfatório, que não implique a utilização de um animal, seja razoável e praticamente possível”
Com a implantação do “Animal welfare guideline” em 1986 (diretriz 86/609/EC), a política declarada das instituições da Comunidade Européia é de estimular e desenvolver o uso de métodos alternativos ao uso de animais.
Merecem destaque na regulamentação dos Métodos Alternativos:
A “Diretiva de Cosméticos” – ou a sétima emenda à Diretiva 76/768 de 27 Julho de 1976) – é, sem dúvida, o marco regulatório no tema. A Diretiva assegurava a livre circulação de produtos cosméticos no mercado interno europeu, garantindo a segurança do produto para os consumidores. E a sétima emenda (Directive 2003/15/EEC of the European Parliament and of the council of 27 February 2003) estabeleceu a proibição de testes em animais para ingredientes e/ou produtos acabados (testing ban), bem como a proibição da comercialização na Comunidade Europeia de produtos (ou seus ingredientes) testados em animais (marketing ban).
O programa REACH – para registro e comercialização de químicos na Comunidade Europeia – requer a avaliação da toxicidade para classificação de substâncias através do uso de métodos alternativos, que também se aplicam ao controle e desenvolvimento de medicamentos, saneantes, dispositivos médicos e que são utilizados para classificação toxicológica de substâncias no sistema global de classificação e rotulagem de químicos (Global Harmonization System-GHS).
A Lei Arouca – recentemente aprovada no Brasil , Lei nº 11.794 de 08 de outubro de 2008 – versa sobre o uso de animais na experimentação e no ensino, regulamentada através do Decreto nº 6.899, de 15 de julho de 2009. Tem como principal objetivo zelar pela ética na utilização de animais em pesquisa e ensino observando sempre os anseios da comunidade científica de, sempre que possível, reduzir o número de animais, evitar seu sofrimento e estresse, bem como sua substituição. Esta lei reforça o compromisso do país com o bem estar e ética na utilização de animais em experimentação avançando no que já fora previsto no artigo 32 da Lei 9.605 de 12 de Fevereiro de 1998, a qual prevê pena de detenção a quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. A implantação e desenvolvimento de métodos alternativos é um passo fundamental para o mais amplo cumprimento da legislação.
A criação do CONCEA – Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal – ocorreu como desdobramento da Lei Arouca. Esta entidade é responsável por credenciar as instituições que utilizem animais em seus trabalhos, além de criar as normas brasileiras de criação e uso de animais de laboratório. Ainda, dentre suas responsabilidades está monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que substituam o uso de animais no ensino e na experimentação.