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Mudanças Climáticas
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Atividades Implementadas Conjuntamente

Anexo a Informação Interministerial para o senhor Presidente da República, assinada pelos Ministros Luiz Felipe Lampreia, das Relações Exteriores, e José Israel Vargas, da Ciência e Tecnologia; em 8 de julho de 1996

1. A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinada e ratificada pelo Brasil, foi aberta à assinatura na Conferência do Rio. Esse instrumento visa a combater as causas do efeito-estufa, responsável pela mudança do clima e o conseqüente aquecimento do Planeta.

2. Os países desenvolvidos, que figuram no Anexo I da Convenção, assumiram o compromisso sob este instrumento de reduzir até o ano 2000 as suas emissões de gás carbônico e de outros gases causadores do efeito-estufa de forma a não ultrapassar os níveis de emissão verificados em 1990.

3. No contexto do fim da recessão mundial, é previsível, em termos globais, o aumento do consumo energético e conseqüentemente das emissões. Essa conjuntura dificulta a implementação das metas fixadas para a redução de emissões dos países desenvolvidos.

4. Em conseqüência, e como forma alternativa ao cumprimento estrito de suas obrigações, os países desenvolvidos têm procurado impor no contexto da Convenção uma reinterpretação do conceito de "implementação conjunta".

5. O conceito de implementação conjunta está vagamente refletido no artigo 4.2 da Convenção. Trata-se de um meio complementar de implementação dos compromissos assumidos, pelo qual Países-Partes da Convenção realizariam projetos conjuntos com o propósito de atingir suas metas de redução de emissões ou o aumento de sumidouros de gases.

6. A reinterpretação do conceito de implementação conjunta que vem sendo advogada pelos países desenvolvidos no âmbito da Convenção pretende estabelecer um "regime de créditos" pelo qual compensariam, mediante projetos financiados em terceiros países, o descumprimento das metas livremente assumidas e que deveriam ser alcançadas em seus próprios territórios no que se refere à redução das emissões de gases de efeito-estufa.

7. A I Conferência das Partes da Convenção, realizada em Berlim em 1995, autorizou os países a darem início a uma "fase-piloto" de projetos de implementação conjunta. Originalmente concebidos para realizarem-se entre países desenvolvidos, desde a resolução adotada em Berlim os projetos de implementação conjunta passaram a incluir também os países em desenvolvimento. A fase-piloto prevê que a participação dos países nesses projetos será voluntária. Os projetos de atividades desenvolvidos conjuntamente deverão ser aprovados pelos Governos, e na fase-piloto não produzirão "créditos" para os países financiadores. A Conferência das Partes deverá rever a fase-piloto até o ano 2.000 (o que implica, em tese, a possibilidade de concessão, no futuro, de créditos para os países desenvolvidos)

8. O Brasil tem sustentado, conforme consignado na decisão pertinente da I Conferência das Partes, que a implementação conjunta deve ser um meio adicional e complementar de cumprimento das obrigações assumidas sob a Convenção, e não um expediente pelo qual os países desenvolvidos possam contabilizar créditos em compensação pelo descumprimento de seus compromissos. Nesse sentido, o Brasil tem expressado preocupação com a tendência a dar-se ênfase excessiva a noção de implementação conjunta, em detrimento das discussões sobre o efetivo cumprimento das obrigações claramente expressas na Convenção.

9. Além disso, para o Brasil, a cooperação entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento deveria ocorrer ao abrigo do artigo 4.5 da Convenção, no qual se prevê a transferência de tecnologias para os países em desenvolvimento e a sua capacitação tecnológica com vistas a permitir-lhes adequar o seu processo de desenvolvimento a matrizes mais limpas no que se refere à emissão de gases de efeito-estufa. A decisão da I Conferência das Partes sobre a fase-piloto faz referência ao artigo 4.5 e afirma que a implementação conjunta é uma forma de executá-lo.

10. A implementação conjunta não tem ainda formato e modalidades definidas. O entendimento corrente é no entanto de que os projetos implementados conjuntamente poderão incluir de parte dos países em desenvolvimento medida: que visem (1) à redução de emissões de gases e (2) à proteção e desenvolvimento de sumidouros e reservatórios de gases de efeito estufa. A primeira modalidade refere-se à adoção pelos países em desenvolvimento de iniciativas que resultem em modificações na sua matriz energética, com a utilização crescente de energias renováveis, e na utilização de tecnologias que reduzam o aumento de emissões, em especial no tocante à queima de combustíveis fósseis. A segunda, refere-se à preservação de florestas tropicais, reflorestamento, e combate ao desmatamento.

11. Conforme reconhece a Convenção, a responsabilidade histórica e presente pelas atuais concentrações de gases de efeito-estufa na atmosfera é dos países desenvolvidos. A concentração atual de gases de efeito-estufa na atmosfera resulta principalmente do efeito cumulativo das emissões geradas nos últimos 150 anos pelas atividades industriais nos países desenvolvidos. Por essa razão a Convenção ressalta o princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas entre os países, e a obrigação dos países industrializados de assumir a liderança na adoção das medidas previstas na Convenção sobre Mudanças Climáticas.

12. Já aos países em desenvolvimento cabe, sob a Convenção, dentre outras, a obrigação de formular e implementar programas nacionais contendo medidas para mitigar a mudança do clima. Esse compromisso, que é comum também aos países desenvolvidos, apresenta-se de forma geral e não está articulado com nenhuma meta de redução de emissões de gases. O Brasil tem afirmado, a esse respeito, que a elaboração do programa nacional será efetuada após a conclusão do inventário nacional de gases de efeito-estufa (outra obrigação de todas as partes), ocasião em que será possível ter um quadro claro das emissões brasileiras. O inventário nacional brasileiro está sendo elaborado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e está previsto para tanto o aporte de recursos externos aprovados pelo GEF (Global Environment Facility).

13. A Convenção é, contudo, taxativa ao afirmar em seu artigo 4.7 que a medida em que os países em desenvolvimento implementarão seus compromissos dependerá da efetiva implementação pelos países desenvolvidos de seus compromissos no tocante à transferência de recursos financeiros e tecnologias e levará totalmente em consideração que o desenvolvimento econômico e social e a erradicação da pobreza são as prioridades primeiras e precípuas dos países em desenvolvimento. Além disso, a Convenção reconhece que as emissões per capita dos países em desenvolvimento são ainda relativamente baixas e que a parte das emissões globais originárias desses países deverá ainda crescer para que possam atender a suas necessidades econômicas e sociais.

14. Desde o inicio da fase-piloto, tem-se verificado insistente pressão sobre os países em desenvolvimento para que endossem a reinterpretação do conceito de implementação conjunta no âmbito da Convenção. A complexidade política da questão tende a aguçar-se em função do interesse que o assunto desperta entre os setores que poderiam ser eventuais beneficiários nos países em desenvolvimento de recursos originários de mecanismos de implementação conjunta.

15. Também no Brasil, algumas empresas públicas e o setor privado (sobretudo na área florestal) começam a receber o assédio sistemático de interesses externos que acenam com a possibilidade de disponibilização de recursos para a execução de projetos de implementação conjunta.

16. A questão também se reproduz no plano hemisférico, onde os EUA vem pressionando pela aceitação generalizada do conceito de implementação conjunta no âmbito das atividades previstas de implementação do Plano de Ação de Miami.

17. As considerações que precedem ressaltam a necessidade de definir os parâmetros de atuação futura do Governo brasileiro no tratamento do assunto no âmbito hemisférico e na Convenção.

18. Essa definição deverá levar em conta, dentre outros, os seguintes elementos:

    a) o conceito de implementação conjunta foi inicialmente concebido como uma modalidade de cooperação entre os países desenvolvidos. Não há, contudo, informação de projetos já realizados envolvendo apenas países desenvolvidos;

    b) dada a natureza ainda inicial da fase piloto, são poucas as informações disponíveis sobre o impacto e alcance de projetos implementados conjuntamente em países em desenvolvimento;

    c) a implementação conjunta pode introduzir elemento de iniqüidade no combate à mudança do clima, na medida em que transfere para os países em desenvolvimento o ônus de adotarem medidas que na prática autorizariam o aumento das emissões dos países desenvolvidos;

    d) a implementação conjunta pode significar a imobilização por um longo período do patrimônio ambiental nos países em desenvolvimento, sobretudo de suas áreas florestais,

    e) não é necessariamente verdadeiro, além de carecer de base científica, o argumento de que a adoção de medidas de redução de emissões e de aumento de sumidouros de gases seria mais eficiente e menos custosa nos países em desenvolvimento;

    f) ainda que o argumento acima fosse verdadeiro, a cooperação para a adoção de medidas adequadas pelos países em desenvolvimento não precisaria ser conduzida necessariamente sob a modalidade de implementação conjunta;

    g) os países desenvolvidos seguramente continuariam pressionando para que as atividades implementadas conjuntamente venham a beneficiá-los com um "regime de créditos" que os exonere parcialmente de suas obrigações no âmbito da Convenção;

    h) existe o risco óbvio de que a implementação conjunta venha a substituir na Convenção o compromisso dos países desenvolvidos de assistir os países em desenvolvimento com recursos financeiros e tecnologias adequadas;

    i) a maioria expressiva das organizações não-governamentais ligadas à área ambiental é contrária à implementação conjunta;

    j) no Brasil, os setores potencialmente mais interessados em explorar a possibilidade de receber recursos externos oriundos de projetos de implementação conjunta seriam os de reflorestamento industrial e a agro-indústria de cana. Não se pode prever no entanto a importância e o volume de recursos que poderiam ser disponibilizados através de projetos de implementação conjunta;

    l) haveria em princípio interesse brasileiro na execução de projetos que visem à conservação de energia, especialmente no setor de petróleo. Mas não há indicação de que os países desenvolvidos pretendessem alocar recursos da magnitude exigida para atender as necessidades do caso brasileiro;

    m) tendo em vista que a matriz energética no Brasil já é essencialmente limpa, (fontes renováveis e não poluentes de energia), o interesse externo em projetos de implementação conjunta tenderia a concentrar-se em projetos na área de proteção de sumidouros (florestas tropicais).

19. Diante das considerações acima, sugere-se a seguinte linha de ação:

    i) manter no âmbito da Convenção nossa oposição de princípio a que as atividades implementadas conjuntamente entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento possam gerar créditos pelos quais os países desenvolvidos possam compensar o descumprimento de suas metas convencionais relativas à redução do nível atual de emissão de gases de efeito-estufa em seus territórios;

    ii) manter posição consentânea no âmbito das iniciativas que derivam do Plano de Ação de Miami.

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