Luiz Martins, da Finep, coordenou a mesa do seminário em Brasília. Foto: Augusto Coelho/Ascom do MCTI
O potencial das compras públicas para impulsionar a atividade inovativa e os desafios para que isso aconteça foram discutidos em painel do Seminário Sistemas de Inovação e Desenvolvimento dos Brics, em Brasília, nesta terça-feira (25). O brasileiro Luiz Martins, assessor da presidência da Finep/MCTI, coordenou a mesa, composta de pesquisadores dos outros países do bloco – Rússia, Índia, China e África do Sul.
Pontos em comum e particularidades despontaram nas apresentações dos participantes, que passaram por legislação, objetivos e resultados. O evento, organizado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), visa gerar subsídios para a Reunião de Cúpula dos Brics, que será realizada em julho, em Fortaleza.
O russo Stanislav Zaichenko destacou que, em países como o seu e a China, o Estado é um ator de peso no mercado e, com isso, tem grande alcance como impulsionador. Ele lembrou que a primeira lei federal para o tema em seu país não contemplava a intenção de inovar, mas que essa dimensão foi inserida no novo marco legal, em 2011, a partir das demandas de instituições de saúde, energia e defesa. No ano passado, complementou, nova legislação referente a contratações públicas se direcionou à inovação. “É um modelo mais flexível, em que, dependendo do órgão, o menor custo não é a prioridade”, descreveu.
Segundo Zaichenko, o investimento da maioria das empresas nessa frente se restringe a compra de novos equipamentos. Ele observou, ainda, que muitas vezes as medidas adotadas na Rússia podem ser entendidas como de caráter protecionista.
O indiano Keshab Das ressaltou o estímulo a pequenas e médias empresas nas compras do governo. Ele contou que o país tem tradição na prática desde o período colonial, e, depois de repensar parte desses investimentos pelo alto custo, estabeleceu em 2012 uma política nacional para essas aquisições. “Há uma lista como 358 itens – já foram 800 – que só podem ser produzidos por PMEs. Além disso, há cotas para apoiar a atividade econômica de castas e etnias marginalizadas”, explicou, ponderando que a informalidade impede que muitas delas acessem tais estímulos.
Para Das, uma maior articulação dos Brics para ampliar a participação na economia mundial exigiria esforços de integração e harmonização de procedimentos e regras relativas ao tema do painel, bem como transparência.
Risco partilhado
Em sua apresentação, o chinês Xielin Liu defendeu que o governo deve partilhar com as empresas o risco dos investimentos inovativos, assim como ajudar a consolidar áreas da economia. Segundo relatou, foi em 2006 que seu país combinou pela primeira vez os critérios de conteúdo nacional e inovação em compras públicas.
Liu citou casos que considera acertos e erros nesse sentido. Entre os primeiros, a transferência de tecnologia de grupos estrangeiros que participaram de obras de engenharia dos trens-bala. No outro grupo, tentativas de emplacar o software livre em produtos de informática. “Nem sempre é fácil distinguir política de compra de reserva de mercado, e os Estados Unidos e a Europa não gostam alguns procedimentos chineses”, comentou.
A debatedora da África do Sul, Erika Kraemer-Mbula, elencou a redistribuição de renda, a formatação de mercados e a proteção ao meio ambiente como objetivos para os quais os governos do seu país vêm usando a política de compras. À semelhança da Índia, existem ações afirmativas para apoiar o empreendedorismo entre a população negra e entre as mulheres.
“Uma das limitações é a falta de critérios para alinhar objetivos sociais e inovativos”, apontou. “Além disso, há um entendimento nas agências públicas de que inovar é uma atividade cara. Essas instituições têm aversão a riscos.” Ela acrescentou que os Brics poderiam mapear as atividades e setores com alto potencial inovador para promovê-los.
Foco
Também Luiz Martins, da Finep, enfatizou a importância de seletividade nas ações com esse fim. Ele lembrou que, no Brasil, as compras públicas movimentam cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB).
“Se o mundo não é plano e a história não acabou, o Estado tem um papel a desempenhar na inserção nacional na economia”, disse. “É preciso entender que o mercado global não é livre, e sim dominado por 500 a 600 empresas oligopólicas.”
Martins apontou entraves legais para a promoção da atividade inovativa, no caso brasileiro – em especial a chamada Lei das Licitações (8.666), de 1993. Na sua avaliação, o debate de hoje reforçou que não se pode tratar, nas regras de compras públicas, todos os materiais e insumos da mesma maneira.
“Na área de inovação, nem sempre o mais barato é melhor”, defendeu. “Se o governo dos Estados Unidos não comprasse 100% da produção de chips na década de 50, essa tecnologia não teria ido para a frente. Se fosse optar pelo mais barato, compraria transistores.”
Texto: Pedro Biondi – Ascom do MCTI