A atualização da legislação e a desburocratização do acesso ao patrimônio genético foram defendidas pelos participantes de audiência pública sobre o tema na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (29). O debate tratou do marco legal em vigor, especialmente a Medida Provisória 2.186-16, de 2001, que instituiu o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN).
Na sessão, da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) foi representado pela diretora de Políticas e Programas Temáticos, Mercedes Bustamante. Compuseram a mesa a diretora de Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Eliana Fonte, o consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) Márcio Mazzaro e a analista de Meio Ambiente Confederação Nacional da Indústria (CNI) Elisa Romano. A mesa foi presidida pelo deputado federal Henrique Afonso (PV-AC), que propôs a audiência.
Os debatedores destacaram a condição do Brasil de líder em biodiversidade e o potencial que ela apresenta de desenvolvimento econômico em novas bases, sob a regência da
Convenção da Diversidade Biológica. Trataram, ainda, sobre a dificuldade de aplicação do Protocolo de Nagoya, que estabelece a repartição justa e equitativa dos benefícios advindos da exploração desses recursos, com um retorno para as comunidades que garantiram sua existência ou forneceram conhecimentos para seu uso. E avaliaram que a
MP 2.186-16 foi concebida num contexto de reação a denúncias de biopirataria, particularmente a um caso que repercutiu à época, e, apesar de sua importância, deve dar lugar a uma lei mais adequada às necessidades do país na área.
Riqueza por conhecer Mercedes Bustamante lembrou que se tem conhecimento hoje de 1,9 milhão de espécies, das quais 13% ocorrem no Brasil, e que o número de espécies desconhecidas pode ser o dobro ou até dez vezes o total identificado. Da mesma forma, disse que o homem usou ao longo de sua história 7 mil espécies de plantas para alimentação, quando o número poderia ser de 75 mil. Ela assinalou, também, o acelerado processo de extinção em curso no mundo todo.
A diretora destacou que a inserção do país na economia verde é uma das metas gerais da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. Citou, como ações da pasta, a criação de quatro redes de instituições dedicadas ao conhecimento e ao aproveitamento da riqueza dos biomas nacionais – dentre elas, a
Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal (Rede Bionorte).
O representante do Ministério da Agricultura observou que a maioria dos alimentos do nosso dia a dia tem origem em outras regiões do mundo. Ele disse que isso pode ser preocupante com possíveis cobranças de outras nações baseadas no Protocolo de Nagoya e defendeu que se invista mais na nacionalização do cardápio. Márcio Mazzaro afirmou, ainda, que o desenvolvimento de novas variedades de vegetais para consumo é extremamente complexo, pela necessidade de autorização prévia do CGEN a cada etapa do melhoramento genético, e que apenas uma, dentre todas as cultivares criadas, está em acordo com a MP vigente.
A atuação do CGEN foi descrita pela representante da pasta do Meio Ambiente, que ponderou que, apesar dos entraves, o conselho já concedeu cerca de 200 autorizações e tem a mesma quantidade de pedidos em análise. O órgão é encarregado de autorizar projetos de pesquisa, bioprospecção e desenvolvimento tecnológico que envolvam o acesso aos recursos genéticos e ao conhecimento tradicional associado no Brasil. "A biodiversidade pode se tornar uma grande vantagem na busca pelo desenvolvimento nacional”, comentou, lembrando que pelo menos 75% das drogas usadas no combate ao câncer têm como matéria-prima moléculas oriundas da natureza.
Marco legal
Para a elaboração de uma nova lei, Mercedes Bustamante resumiu: “A posição do MCTI é permitir que se destrave o acesso sobretudo para fins de desenvolvimento de pesquisa e do desenvolvimento científico, e que isso resulte numa valoração da biodiversidade que permita conservá-la .” A seu ver, é fundamental que o novo marco legal tenha flexibilidade, para que não fique ultrapassado diante do ritmo das descobertas
Elisa Romano, por sua vez, apresentou as propostas da CNI para a questão. A entidade defende que a repartição de benefícios seja fixada em lei e se dê num único momento do processo produtivo – a sugestão é que caiba ao empreendedor e incida na comercialização dos insumos. Propõe também uma simplificação para o cadastro de empresas e instituições, que seria autodeclaratório. “O uso desses recursos tem que estar alinhado com as políticas que estimulam a inovação e a competitividade”, acrescentou.
Texto: Pedro Biondi – Ascom do MCTI